segunda-feira, 15 de setembro de 2008
Descabida Perseguição
Um carro passando por uma estrada chama a atenção pela sua aparência, que é tão desgastante quanto a da própria motorista, que perdida em seus pensamentos, dirige como uma autômato, apesar de estar a contemplar a beleza que vai deixando para trás. De repente se põe a imaginar em como tem sido longa a sua jornada. Perdida em seus devaneios não percebe que, a medida que vai se aprofundando
seus pensamentos, o seu pé afunda no acelerador.
Continua divagando... sua mente está um caos. Volta a pensar sobre a sua incansável busca, sua descabida perseguição.
Nunca repara quando anoitece, nem tão pouco quando amanhece. Nunca sente fome, muito embora tenha a alma faminta. Nunca sente sede, mesmo tendo o espírito sedento.
Nunca refresca o corpo, pois sabe que jamais conseguirá aplacar o calor que ele emana. Nunca tenta elucidar um fato, pois sabe que a sua memória continuará sempre confusa. Nunca dorme e sempre sonha, e continua a sonhar sempre... sempre. Ela sabe que é necessário, sente que é fundamental encontrá-los para tentar resgatar o que é seu de direito, e talvez assim ela consiga ter um pouco de paz, podendo dessa forma matar a fome de sua alma e a sede do seu espírito, e tendo a ambos saciado, poderá por fim dormir sem precisar sonhar ou ter pesadelos.
Atravessa mais uma cidade, percorre mais um vale... a beleza estonteante que se estende a perder de vista, deixaria qualquer um deslumbrado, mas a ela nada toca, tudo lhe é indiferente, nem mesmo a calma do lugar consegue dar-lhe um pouco de paz.
Com sofreguidão transpõe rapidamente aquele trecho do caminho que só aumentara os seus pensamentos alienados.
Termina de passar pelo vale, toma uma outra estrada. Ela está só com os seus pensamentos, com as sua lembranças. Sempre esteve só, desde aquele maldito dia em que lhe foi roubado o que tinha de mais caro, de mais sagrado. Mergulhando em suas reminiscências, volta a pensar na vida e retorna ao passado... Desde quando ela anda nessa louca busca, nessa incansável perseguição, não sabe, há muito que ela se perdeu no tempo. Já não tem certeza de mais nada, sabe apenas que é diferente de todos, como sabe também que qualquer que seja a situação, jamais será igualada a qualquer outro.
Continua a meditar e em seu tormento não percebe o quanto está correndo. Sua ideia é fixa. É preciso encontrá-los.E assim pensando, dá-se conta de que não saberá como agir, não tem noção do que irá fazer, mas sente que naquele momento, isto não é importante. Importante será encontrá-los.
Termina de percorrer a estrada e segue por outro caminho, tomando a direção de uma rodovia federal. Se envolvendo mais e mais com os seus pensamentos, ela aumenta a velocidade do carro ainda mais. Seus cabelos esvoaçantes, vez por outra tapa-lhe a visão, mas ela continua a correr e em louca corrida e em contato com o vento sente uma estranha sensação de liberdade. Sente-se livre... e em sua desvairada imaginação, até se julga um pássaro com grandes asas e a voar. - Mas por que essa sensação de liberdade tão forte, se muito mais forte ela tem sua alma prisioneira e o seu coração acorrentado?
Subitamente ela se vê despertada dos seus pensamentos, sem no entanto dar-se conta do que a fizera voltar a realidade. Olhando pelo espelho retrovisor, percebe estar sendo seguida por um carro da patrulha rodoviária , então ela percebe que estava desenvolvendo uma velocidade muito alta, menosprezando a existência de tantos que provavelmente por ela havia passado. Ao receber sinal dos patrulheiros para que pare, sem pressa, ela procura um bom local , estaciona, desce e fica aguardando a aproximação dos mesmos. Um deles, o de um pouco mais de idade que o companheiro, se aproxima, e observando aquele rosto abatido, e aquele corpo com aparência de extremo cansaço, olha bem naqueles olhos que só espelha dor, tristeza e solidão, indaga:
- Onde a senhora pensa que vai nessa louca corrida?
- Desculpe-me seu guarda. - Responde a figura e continua: - Ao perder-me em meus pensamentos não percebi a falta que estava cometendo.
- Mas a senhora não respondeu a minha pergunta, e por favor me mostre seus documentos.
- Pois não, aí está meu documento. - E assim dizendo, ela pega um papel e entrega a ele.
O patrulheiro pega o papel e antes de olhar para o mesmo torna a perguntar: - Onde a senhora ía com tanta pressa? de que a senhora está fugindo?
_ Eu não estou fugindo. Eu estou a procura de três facínoras. Um deles me roubou, o segundo destruiu o que o primeiro havia roubado, e o terceiro ajudou a ambos...
- Por que a senhora não deu parte à polícia?
- Porque isto de certa forma seria impossível. Eles são intocáveis.
- Nesse caso tente a senhora me explicar quem são e o que roubaram, que apesar de já ter sido destruído a senhora tenta desesperada reaver.
E com aquele olhar triste ela encara o homem e fala:
O que busco com tanto desespero, não é nada e é tudo. Eu busco o amor que o tempo ladrão roubou, que a distância destruiu ajudada pelo destino. Responda-me moço, poderá alguém pegá-los?
Com o cenho franzido o guarda exclama:
- Inacreditável!... é evidente que são intocáveis. Só não consigo imaginar como a senhora pretende agir se os encontrar.
- Eu há pouco tempo atrás também não sabia, mas agora, com toda segurança lhe digo que já sei. O sr: já ouviu falar que o amor vence até a morte?
- Por acaso a senhora está me dizendo que na morte encontrará uma maneira de resolver o problema?
- Não, isso nunca! o que eu estou tentando lhe dizer é que para tudo há uma solução. Logo, quando eu chegar ao lugar certo e no momento certo, entrarei de mansinho e sutilmente, sem que nenhum deles perceba, irei enfrentá-los e com a força do meu amor haverei de vence-los, reconstruindo o que eles julgam ter destruído, pois o amor vence tudo... tempo... distância... tudo enfim...
Boquiaberto o patrulheiro balança a cabeça, e mais abismado fica ao ler o papel que a figura lhe havia entregue momentos antes.
- Minha senhora, isto não é um documento!
- Eu sei... isto é o resumo dos meus sentimentos durante meses a fio, como o sr: bem pode ler, aí está o meu nome, preciso lhe dizer mais alguma coisa?
- Não. - Responde o Guarda atordoado e prossegue.
- Boa viagem... dona saudade
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário