quarta-feira, 17 de outubro de 2012

DESTINO


CATEGORIA: CONTO

Está uma manhã bastante agradável. O trânsito, como sempre... Infernal. E para Marta tudo está conforme seu estado de espírito... Melancólico.
O sinal vermelho faz parar o trânsito. De um lado da calçada, uma criança pede esmolas, enquanto que duas outras observam os carros, os motoristas. Em cada par de olhos, uma esperança perdida, um sonho que nem sequer teve a chance de ser sonhado.  Marta era uma mulher resolvida na vida, profissionalmente, já seu coração, este continuava adormecido,  ainda não havia surgido o homem que o faria despertar.
O sinal abre. No momento em que vai dando saída, sente-se observada de uma maneira muito forte. Olha de relance e e vê uma das crianças olhando-a de maneira fixa. Sente-se incomodada com a firmeza daquele olhar, mas decidida segue em frente, mas aquele olhar parece segui-la, transfixando os obstáculos e atingindo sua alma.
Decide retornar. Estaciona um pouco distante e fica observando as crianças. Desce do carro e vai caminhando até aquele sinal. As crianças são magras, maltrapilhas, mal cuidadas. Olha para seu scarpin tão caro, sua bolsa de quase um salário mínimo e sente-se envergonhada.
Ao chegar junto das crianças para e fica sem jeito. Nesse momento uma das crianças se aproxima e pergunta: - tia, a senhora também veio pedir comida? Ela olha pra menina tão pequenina e sente um amor profundo lhe tocando o coração. Nisso um dos garotos (eram dois) se aproxima e critica a menina: - Não seja boba Maria, a tia é rica, ela tem até carro. A menina fala com voz suave. Você tá mentindo, ela não tem carro. Você tem carro tia?
Marta, momentaneamente fica sem ação, então o menino, que se chamava Luiz fala: - Eu a vi passando e ela estava de carro. imediatamente ela lembra do olhar forte que tanto a havia incomodado. Sorri para a garotinha e responde: - Meu nome é Marta. Voltei pra conversar um pouco com vocês, pode ser?
O outro menino que até aquele momento não se manifestar, ficara apenas observando, falou desconfiado.
- Eu sou Zezinho. E a senhora quem é e o que quer com a gente? Marta olha pra cada uma das crianças e calmamente pergunta pelos pais deles e onde moram. O Luiz que parecia ser o mais velho é quem responde. - Meu pai matou a minha mãe, foi preso e morreu no presídio, numa briga (rebelião)  e nós ficamos com a vovó, que está muito doente. Saímos pra rua e pedimos comida pra nós e ela.
Com os olhos cheios de água pede a eles que a levem até a casa deles. Imediatamente o Zezinho olha desconfiado e diz que não precisa, que eles se viram, pois eles têm medo de serem tirados da avó e depois de levados, separados. Passamos fome, mas sempre ficamos juntos. Ela promete as crianças que nunca fará isso, que só quer ajudá-los.
Após minutos de indecisão e desconfiança eles decidem levá-la. Não muito distante, embaixo de um viaduto, ela vê um amontoado de tábuas e papelão montados em forma de quadrado. Alí está a casa daquela crianças. Se aproxima e no local que parece ser a porta, vê uma senhora magérrima deitada sobre alguns papelões. Entra no cubículo e vê a desconfiança naquele olhar moribundo. Tenta falar, mas é interrompida pela voz quase inaudível daquela mulher que traz no rosto marcas do tempo e mais forte ainda de sofrimentos e miséria.
- Moça, foi Deus que a mandou aqui? será você quem vai cuidar dos meus netinhos?
Marta se agacha ante aquela mulher de pobreza imensa e sente a riqueza de sentimentos que transborda daquele coração e fala. Eu vou levar a senhora para um hospital e as crianças para a minha casa. Quando a senhora ficar boa, nós vamos ver como resolveremos a situação.
e assim ela fez. A pobre mulher, que se chamava Verônica, passou quase três meses no hospital. Dia sim, dia não a Marta a visitava e aos domingos levava as crianças para verem a avó.
Seis meses se passaram desde aquela manhã no semáforo. Mirtes também levou aquela senhora para sua casa.(por sinal, um casarão, onde ela vivia apenas com uma empregada após um acidente trágico onde ela perdeu o esposo e o casal de filhos, apenas ela sobrevivera). Demorou muito para que ela se recuperasse, e a Tina, sua fiel empregada cuidara dela como se fosse sua filha. Apenas a moça que fazia faxina duas vezes por semana frequentava aquela casa. Mas agora sua casa se encheu de risos, sua nova família está lá fora no jardim. Ouve a d. Verônica chamando os netos e sente uma grande paz invadir a sua alma. Nisso ouve a voz da pequenina Maria chamando-a: - Mamãe venha lanchar!
Emocionada ela sai para o jardim, beija a testa da mulher, naquele momento tem um semblante sereno,e um olhar de agradecimento eterno. Abraça-se às crianças e diz: - Vamos meus filhos amados, vamos lanchar e depois quero ver se já fizeram as lições de casa. Ela sente-se realmente feliz e sabe que a sua grande dor, não passa de momentos passados que ela guardou junto com as boas lembranças. O destino um dia lhe fora cruel, mas hoje ela sabe que foi também o destino que a fez mudar de caminho naquela ensolarada manhã.

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